19 de dez. de 2008

Mecê dos qualé?

Dia desses estive na livraria Livros & Companhia, que fica em frente ao Colégio Instituto de Educação, onde estudei até concluir o ensino médio – no meu tempo se chamava Educação Geral. Na livraria eu procurava alguns títulos em específico, mas, parei também para conversar com o proprietário da loja, José Nilson.

O gaúcho é um sujeito meio careca, com óculos de aros grandes e arredondados, bigode espesso e uma inseparável cuia de chimarrão. (Na foto ele está sem a cuia, mas é uma situação atípica). Não é por acaso que duas cadeiras confortáveis ficam diante de sua mesa, à disposição de quem entra na loja. Ele está sempre disposto a conversar e confere significado especial à palavra “companhia” escrita na placa diante da livraria. Tem ótima memória. Já fazia meses que não trocávamos uma palavra, mas ele parecia lembrar de tudo o que já tínhamos conversado. Eu, no entanto, confundia tudo. Achei até que a loja tivera um daqueles sensores de presença que apitam sempre que o cliente entra. José me lembrou que nunca teve isso, porque acha que incomoda, e porque acredita numa relação mínima de confiança entre o vendedor e o cliente.

José comentou que no próximo ano, lá pelo mês de março ou abril (ele foi preciso na data, mas não tenho a memória prodigiosa que ele tem) deve deixar a cidade, e transportar consigo a livraria. Disse que o motivo não é simplesmente financeiro. Está acostumado a não ficar parado em um lugar. “O mundo é tão grande... porque ficar em um lugar só. Há pessoas que nascem em um lugar e passam a vida inteira nesse lugar”, comentou, sem compreender. Afirmou que é importante se deslocar, para conhecer outras culturas e formas de pensar e agir, e assimilar isso tudo.

Ficamos dialogando um pouco, até que chegou outro cidadão, chamado Rogério. Não o conhecia, mas parece ter muitas histórias para contar. Comentou sobre uma viagem que fez a Portugal, narrou rapidamente situações em outras cidades. E, considerando que ele, assim como José Nilson, não é de Ponta Grossa, começaram os dois a divagar sobre a natureza do ponta-grossense. Seu comportamento fechado, principalmente.

José dizia que os vizinhos não se falam, e que é difícil até mesmo cumprimentar alguém. Disse que, depois que chegou na cidade, ele próprio começou a mudar seus hábitos, parando de puxar papo com todos, como costumava fazer antes. Lembrei a ele que esse era o lado ruim de se deslocar de uma cidade para a outra. Hábitos não tão valorosos também são assimilados, junto com os que nos fazem crescer culturalmente.

Expliquei que, tendo nascido e crescido aqui, é muito mais difícil para mim notar essas coisas – os comportamentos tão criticados nos ponta-grossenses. Até porque meu relacionamento com os vizinhos não é tão ruim assim. Mas quem vem de fora costuma fazer esses mesmos comentários – de que as pessoas são muito fechadas, evitam cumprimentar.

Rogério completou, dizendo que o que mais lhe chamou a atenção ao chegar em PG foi o fato de as pessoas quererem saber a que família ele pertencia. Havia uma necessidade de relacioná-lo a outros que fossem da cidade, de famílias cujo nome fosse conhecido.

“Mecê dos qualé?”, perguntei, em tom de brincadeira, lembrando o modo simples com que muitos realmente procuram saber a família a quem alguém pertence, como se fosse obrigação apresentar os antecedentes de boa conduta, para dar seguimento a uma conversa.

O diálogo seguiu por outros caminhos, até que Rogério comentou ter uma chácara na região de Guaragi, que fica a cerca de 27 quilômetros do centro de Ponta Grossa.

“Tenho parentes no Guaragi”, comentei.
“Ah, é? – ele perguntou – “Quem são seus parentes? Qual o sobrenome?”

Foi aí que achei graça, e tornei a brincar: “Mecê dos qualé?



SERVIÇO:

Livros & Companhia
endereço: R: Dr Joaquim de Paula Xavier 585
telefone: (42) 3027 2227
site: http://www.livrosecompanhia.com.br

2 comentários:

caroline p. disse...

Concordo com José Nilson: o mundo é imenso para pertencermos a um só lugar. Excelentes personagens e história pra contar. =)

Anônimo disse...

O mundo é enorme... e as pessoas ainda se preocupam com coisinhas tâo insignificantes!