26 de jan. de 2006

A força da carranca

Quando encontro o Ben Hur costumam surgir algumas situações que parecem convidar à reflexão. Ontem, enquanto estávamos num café no centro da cidade, surgiu à porta um menino, que disse:
_Tio, tem dez centavos?

Fomos unânimes em dizer que não tínhamos dez centavos. O que, embora estivesse perto da verdade, não era completamente correto. O menino tentou outra coisa:
_Então me dá uma coxinha?

Piorou, né? Ninguém ia dar coxinha nenhuma. Nós, inclusive a funcionária, dissemos que não tinha coxinha também. E outra vez não estávamos mentindo. Depois de uma certa hesitação, o menino resolveu ir embora.
Apesar de ser trágica, tivemos que rir da situação. De fato, não havia coxinha. Eu tinha comido a última. O café estava na hora de fechar, de modo que a funcionária, impaciente, já havia guardado todos os salgados, desligado a máquina de café expresso, e olhava pra gente com o objetivo de nos convencer a ir embora.
_Caramba... a gente nega dez centavos e eles vão subindo os valores. Se não tem dez centavos a gente tem que dar uma coxinha? Não deveria ser o contrário? – comentei, pensando num leilão.
_ O garoto pediu dez centavos. Mas não queria dizer que ele queria dez centavos. – disse Ben Hur – “Dez centavos” era apenas simbólico. Ele quis perguntar se não tínhamos nada para dar pra ele. Dez centavos... Uma coxinha...

Acontece que era a primeira vez que entrávamos naquele estabelecimento. Ali, descobrimos que o preço do cafezinho não era o mais barato da cidade. Soubemos, também, que o sabor do café não estava dos melhores. E descobrimos, estupefatos, que o café médio é tamanho pequeno, e o café grande é tamanho médio.
Talvez por isso (como forma de vingança), ou porque não tivéssemos nenhuma pressa, fizemos questão de permanecer no local até o último minuto. Ben Hur, inclusive, perguntou à funcionária:
_Você deve estar apenas esperando que a gente vá embora, para poder fechar o café, certo? A que horas você fecha?
Ela olhou para o relógio de parede, que marcava 18h45, e respondeu:
_Fecho às dez para as sete.
E Ben Hur conseguiu tirar um sorriso do rosto ainda carrancudo, quando comentou:
_Ah, então ainda temos cinco minutos.
_Tudo bem, se você limpar o chão... – ela disse, rindo.
E eu completei:
_Se você abater dois reais de nossa conta, a gente limpa o chão.

Logo depois, saíamos do café. E eu comentei com Ben Hur:
_Reparou? Ela estava toda séria. Você conseguiu arrancar um sorriso daquele rosto.
_Pois é... Nem lembro mais qual foi a senha. Acho que foi quando falamos da coxinha.
_Não... foi quando ela falou de limpar o chão.
_Ah, é...
_Mas é tão melhor quando alguém atende a gente com um sorriso, não é?
_Uhn... sei lá. Ficar sério é mais cômodo. O sorriso acaba desarmando a pessoa. Se a pessoa já chega sorrindo em algum lugar, o pessoal acha que pode sacanear com ela. O sorriso acaba demonstrando fraqueza. É por isso que costumo ficar sério.

Desde então, fiquei pensando nessas palavras. E no quão ingrata pode ser a vida para aqueles que, simplesmente, não querem ser antipáticos. Talvez por isso não seja possível cumprimentar uma pessoa no ponto de ônibus, sem que se sinta um certo grau de estranhamento. Talvez por isso boa parte da população mundial permaneça com a face imóvel como rocha. Uma tática de defesa. Uma precaução. Se o sorriso é sinal de fraqueza, então sabemos que a humanidade se torna mais forte a cada dia.

4 comentários:

Anônimo disse...

oi Danilo!! que crônica feliz vc fez amigo! acho que realmente o que a mundo precisa é de sorriso, de risadas e de alegria. E tudo isso é de graça. A gente pode cumprimentar quem a gente quiser com um sorriso. Uma vez li numa reportagem que deveríamos ser como os bebês, paqueradores natos. Não no sentido sexual, homem e mulher do termo, mas no sentido de cativarmos uns ao outros, mesmo que seja um outro que não conhcecemos.
O mundo realmente está sério demais, forte de demais. Mas acho que o sorriso que é um sinal de proteção, de fortaleza, porque quando a gente sorri a gente consegue desarmar as outras pessoas...
um beijo pra vc, sinto sua falta e a falta do seu sorriso amigo querido!

Anônimo disse...

ai Danilo !!

eu adoro estar sempre sorrindo e sou feliz por isso !

ñ acho q sorrir seja sinônimo de fraqueza ! da onde saiu isso !

claro q vc ñ sai por aí sorrindo p/ todos - se bem q algumas vezes eu faço isso, hihiihihihhihi

tem uma frase assim: é mais ou menos isso: o sorriso enriquece quem recebe sem empobrecer quem fornece
abraaaaço e muitos sorrisos e risadas ! Tônia

... dessa vez eu assinei pq esqueci a senha de usuário ......

Anônimo disse...

RESSALVA AO TEXTO
Ben-Hur

Acho que faltou uma contextualização maior do que eu comentei por alto. Embora fico feliz de um tema de nossa conversa possa se ter convertido em texto, mais feliz por saber que eu consigo convidá-lo à reflexão. Sugiro que, para uma apresentação pública, sejam criados personagens inspirados nos reais, ou sempre vai ter alguém como eu dizendo que "não foi aquilo que eu disse".

Não acho que sorrir é um sinal de fraqueza. Penso que, de modo geral, uma seriedade inicial permite avaliar melhor o grupo ao qual chegamos. Filosofia pessoal, aplicável a mim. É também um pouco da afamada desconfiança caipira, cultura que me orgulho de me incluir.

Sei que um sorriso abre portas e que alguns dos melhores momentos da vida tiveram como senha, resultado ou veículo um belo sorriso, não importando o número de dentes ou a moldura dos lábios. Um belo sorriso não é uma estética em si, é um apelo, uma humanização necessária.

Os gregos gostavam de dizer que o homem é o único animal que ri. A razão, a imaginação, talvez não seriam uma distinção tão honrosa quanto a de sorrir. Assim penso.

Talvez ao dizer a frase eu tivesse feito uma leitura daquela carranca a partir de um aforismo do pai dos crápulas, Maquiavel, que é "melhor ser respeitado que amado".

O pensador estava falando a soberanos, senhores feudais, aristocratas italianos, gente imiscuída no mar de lama dos bastidores de toda política daquele tempo. Meias palavras não caberiam bem naquele jogo e os ditames da política passaram a valer mais que os da ética.

Imagino que a vida seria muito melhor se todos sorrissem. Mas nas relações de trabalho ou questões genéricas de autoridade, a máxima maquiavélica cabe aqui e ali. É decepcionante ver a aplicabilidade desse conceito em relações de poder. "Outro mundo é possível", como não?

Ainda bem que a vida não é poder e que poder imaginado não signficia poder consagrado. Menos mal.

Despeço-me com "Podres poderes" do Caetando, sorrindo com todos que entoarem a mesma letra

Enquanto os homens exercem
seus podres poderes
Morrer e matar de fome, de
raiva e de sede
São tantas vezes gestos
naturais
Eu quero aproximar o meu
cantar vagabundo
Daqueles que velam pela
alegria do mundo
Indo mais fundo

Anônimo disse...

putz,agora vc viajou...cara feia,para mim,tem outro nome...rs