18 de mai. de 2009

Anjos e Demônios

Sou quase um viciado em filmes. A cada semana, preciso ver pelo menos um que seja razoavelmente bem feito, do contrário meu bom humor pode ficar seriamente comprometido. Por isso, nesse domingo, eu tinha programado ir ao cinema à tarde. Mas uma mudança nos planos me fez ir ao Estádio Germano Krüger, assistir ao jogo de futebol.

Quando cheguei, os times já estavam em campo, e as arquibancadas pareciam lotadas. Fiquei perto do alambrado, de onde pelo menos tinha uma boa visão do jogo. O sol estava quente, mas não desconfortável, graças ao frio de inverno, já em outono.

Há muitas coisas que, teoricamente, poderiam incomodar alguém que vai ao estádio com a proposta de assistir à partida de futebol. Por exemplo, os sujeitos que preferem o esporte de cuspir no bandeirinha, xingar os jogadores do time adversário, esparramar fumaça ou papel picado. Até a “ola” pode ser algo chato para quem não quer perder um lance do esporte. Mas essas coisas já não me aborrecem. O Germano, assim como os demais estádios, tem algo de Coliseu.

O que me incomodou foi um sujeito que resolveu ficar em pé na parte mais alta do alambrado. Eu estava num lugar onde a presença dele não podia me afetar, mas percebi que o fato de ele ficar naquele ponto impedia parte da torcida de enxergar o campo. Um dos torcedores gritou de maneira não muito educada, dizendo para ele descer de lá. O rapaz pareceu não ouvir, ou fingiu não escutar.

E aquela situação me fez criar uma antipatia instantânea pelo sujeito no alambrado, sujeito que eu nem conhecia. Sabe quando a gente antipatiza com alguém logo de cara? Pois é... acontece.

O primeiro tempo de jogo não foi cheio de belas jogadas. O segundo tempo teve um gol do meu time, único marcado na partida. Terminou tudo em 1 a 0. E fui embora.

Em casa, publiquei uma notinha com o resultado do jogo no site do jornal. E decidi ir ao cinema ainda. Tinha uma sessão às 21h30. Outra às 20h. Naquele momento eram 19h20. Será que dava tempo de assistir à sessão de 20h?

Peguei o carro, dirigi até o shopping, e encontrei uma fila de cerca de vinte carros que esperavam para entrar no estacionamento. Olhei no relógio: 19h39. “Uhn... até as 19h47 devo ter estacionado o carro. Chego na sala de cinema a tempo de ver os trailers”, pensei.

Engano. A fila de automóveis avançava mais lentamente do que eu supunha. E, estranho... saíam cinco carros do estacionamento, entrava um. Quando, enfim, pude estacionar, olhei no relógio de novo: 20h02.

Já era. Tinha perdido o começo do filme. E não há nada que prejudique mais meu humor do que perder um filme. Ainda fui até o cinema, onde descobri que, mesmo que tivesse chegado na hora, não poderia ter visto a sessão. “Anjos e Demônios”, sala 4, 20h, estava lotado.

Determinado a ver o filme, só podia esperar a sessão de 21h30. Infelizmente, isso significaria pagar mais caro pelo estacionamento, e esperar uma hora e meia sem ter o que fazer. Mas, fiz isso, comprei o ingresso para o mesmo filme, na sala 1.

A livraria já estava fechando, não poderia fuçar os livros e discos lá dentro. Nada me atraía na praça de alimentação. Caminhando um pouco diante das vitrines, mundo pequeno, vejo o mesmo sujeito do alambrado do Germano Krüger. Mantive distância.

Fui nas Lojas Americanas e olhei, sem interesse, os DVDs que estavam à venda. Bateu um sono, sentei no chão e fingi que procurava algum filme em específico nas prateleiras mais baixas.

De repente, já eram 21h. Tive receio de que fosse se formar uma fila gigantesca diante da sala 1. Como eu queria, no mínimo, um bom lugar, resolvi me antecipar. Ao sair das Americanas, descobri que já estavam fechando a loja. Quase fiquei preso lá dentro. Ninguém ia me achar atrás da última prateleira da seção de DVDs.

A fila já tinha se formado e, poucos minutos depois, liberaram a entrada. Escolhi uma boa poltrona. Depois dos trailers (dentre os quais a Era do Gelo 3 fez todos rirem), o filme começou, e esqueceram de apagar as luzes da sala. Aquilo estava me deixando inquieto, mas eu fazia um esforço para me concentrar no filme. Se perdesse um detalhe, poderia não entender o resto da história.

Finalmente lembraram de apagar as luzes. E por mais de duas horas pude me deixar hipnotizar pelas imagens em movimento. Ao meu lado direito se sentou um casal. A mulher tinha um riso agradável, que só era acionado nas horas certas. “Moça inteligente”, pensei, ao notar que ela reconhecia a ironia sutil que os personagens davam a determinados diálogos.

“Anjos e Demônios” me pareceu excelente filme. Quem não viu a história anterior – O Código Da Vinci – pode compreender esse mais recente sem problemas. Embora quem já viu o primeiro possa criar mentalmente uma história para o personagem principal, o professor Robert Langdom, interpretado por Tom Hanks.

Como a história gira em torno de temas atuais ou recentes (como a antimatéria e a eleição papal), isso dá uma sensação de proximidade com a trama, diferente do que acontece com muitos filmes cuja história não tem elementos tão atuais, como são aqueles com aliens, espíritos e robôs. Os jornais, atualmente, ainda falam de cientistas determinados a criarem em laboratório uma simulação do que foi o Big Bang, e a história do filme passa perto disso. E pelo conflito entre religião e ciência.

Quando saí da sala, as luzes do shopping já estavam quase todas apagadas (essas eles lembram de apagar antes que a gente deixe o lugar). Uma multidão caminhava em direção às saídas e, quando percebi que boa parte das pessoas ia pagar o estacionamento, acelerei o passo. Não estava a fim de enfrentar mais uma fila extremamente demorada, agora para sair.

Cheguei à fila ao mesmo tempo em que chegava... o sujeito do alambrado. Cara mais chato... Alguns amigos dele chegaram em seguida e começaram a conversar. Ele disse que tinha ido ao jogo, e que a partida tinha terminado em 2 a 0 para o Operário. O outro corrigiu: “Foi 1 a 0, cara. Eu nem fui no jogo e sei mais que você!”

Tive, então, certeza de que ele não tinha se pendurado no alambrado para ver melhor o jogo. Ficou lá porque é um desses caras que gostam de aparecer. Porque não se importa com quem está ao redor. Esses tipos que ligam o rádio no volume alto, achando que são generosos ao dividir sua música com os demais. Você reconhece facilmente essas figuras caminhando nas ruas. São aqueles que não dão lugar na calçada. Aqueles a quem você pede um favor e eles estipulam um valor. Esses tipos estão por toda a parte.

Por isso é tão importante quando a gente encontra o oposto. Uma pessoa que se importa com os outros da mesma maneira como se importa consigo mesma. É raro, e quando acontece, é fácil perdê-la. O mundo é pequeno quando encontramos tipos detestáveis. E imenso quando encontramos quem realmente importa.

Preciso achar um meio de tornar o mundo maior.

3 comentários:

claudia disse...

"Preciso achar um jeito de tornar o mundo maior." Lindo, lindo...

Adorei o texto.

Cláudia

Patrícia disse...

tocante!!!!
lindo texto

Patrícia disse...

E a mais pura verdade!!!!