9 de dez. de 2006

Nenhuma certeza aqui também

Na quinta-feira, a praça Duque de Caxias parecia repentinamente suja como nunca foi. Com a terra sobre a calçada, o capim crescendo entre as pedras, a estátua encardida e os bancos vazios. A coisa mais clara ali era uma folha vermelha que caiu do alto de uma das árvores, e que só continuou limpa porque não ficou ali.

Ao longo do final da semana, situações embaraçosas pareciam me perseguir. No banheiro do shopping, dois sujeitos brigavam por algo idiota como uma toalha. Talvez o funcionário da limpeza e um dos clientes. Lavei o rosto e saí rápido, antes de ver como terminaria a discussão.

Na rua, um japonês discutia com uma senhora morena que bateu num menino loiro. O Brasil é um país de união das raças. Onde está a união se todas elas brigam? “Fala pra ele que não bati em você”, disse a mulher para o menino. “Ela não bateu...” balbuciou o garoto, enquanto começava a chorar, sabendo que apanharia mais se dissesse o contrário.

A mulher que entrou no elevador olhava diretamente para o espelho, parecia enxergar a si mesma, mas fingiu não me ver, talvez para evitar um cumprimento cortês. Estava, com certeza, aborrecida.

O porteiro do prédio, um pouco acima do peso, foi até a porta e ficou ali, sem perceber que me aproximava. A porta é estreita. Sua presença interrompia minha passagem. De repente ele se virou, e percebeu que eu esperava a liberação do caminho:

_Opa! Estou trancando a porta! – disse, constrangido.
_É seu trabalho. – respondi, ácido, pra me arrepender depois.

“Quando algo está ruim, o pior vem logo atrás”. Ouvi alguém dizer enquanto passava em frente ao Café XV, logo depois de sair da redação. Aquela frase, proferida lá pela hora do almoço, me fez sentir uma vontade louca de provar o contrário.

Mas, de algum modo, a frase é verdadeira. Não que as coisas realmente piorem quando algo dá errado. Mas, quando algo dá errado, temos a tendência a enxergar outras coisas também erradas. O aborrecimento se expande, e parece atrair situações desagradáveis. Só que o desagradável somos nós mesmos. Do contrário, tenho certeza, nem teria ouvido a frase dita no café.

Porque quando tudo está certo, à noite, a Lua foge à lógica e parece maior e mais brilhante. E quando uma coisa está ruim, o próprio Sol fica súbita e constantemente encoberto, com a explicação científica do tempo nublado. E ao redor as pessoas falam palavras ruins, e acontecem situações chatas.

Tudo isso é porque algo deu errado, lá, no começo do dia, ou no final do dia anterior. Talvez porque não dormi direito ou não jantei quase nada. Talvez porque deixei de ver aquele filme engraçado, ou porque deixei de ver aquele sorriso.

Se acordássemos sempre pensando em algo bom, certamente os dias seriam melhores. E esse texto não seria tão genérico, com pequenas coisas desconexas sem início meio e fim.

Falaria a respeito da praça Barão de Guaraúna, que nunca esteve tão iluminada para o natal e, mesmo em silêncio, parece tocar alguma música. Ou sobre a moça da locadora de vídeo, que vestia um capuz de Papai Noel e disse, simpática, “temos apenas DVDs, as fitas de vídeo nós já vendemos todas”.

Lembraria mais da menina que sorriu para mim, ao entrar no elevador, logo que a mulher aborrecida saiu. Pensaria na risada que deixei escapar, quando o colega me contou como derrubou o celular dentro de uma pia cheia de água.

A observação do que acontece ao nosso redor depende do que acontece dentro de nós. Depende dos diálogos que temos, do filme que vemos ou do livro que lemos. Estou lendo um cujo título é “Nenhuma Certeza”, de um sujeito chamado Michael Larsen.

Ontem li um trecho que dizia assim: “Às vezes uma coisa fica na consciência da gente como uma luzinha incômoda. Em estoque. Pode ser uma coisa que a pessoa diz, ou a maneira como ela se comporta. Os jornalistas se habituam a observar, a ver, a reparar nas coisas. Às vezes, mais do que gostariam”.

Eu devia parar de ler textos que fazem tanto sentido. Eles me obrigam a escrever coisas menos significativas, para os outros. E detesto escrever para mim mesmo.

2 comentários:

Anônimo disse...

eu gostei =)

noone disse...

=] cada vez mais eu acho que as pessoas estão descobrindo como realmente funcionam as coisas.. momentos como este, de parar pra pensar e ver que naum valia a pena ter parado e pensado me fazem... parar pra pensar que naum deveria ter pensado de novo.. nada muda.. por mais observações e vontade que tenhamos sempre vai continuar sendo a mesma coisa.. aprendi uma coisa qdo ainda estudava, uma andorinha só não faz verão... e pra achar outras como vc ou eu [e tão difícl quanto estar morrendo de fome e querer comer uma panelada de talharin a carbonara sozinho... =] texto sigficativamente significativo.. gosto da forma como escreve e tenta expor a bizarrisses do seu dia =]