27 de set. de 2021

Aberta temporada de caça às amorinhas

Minha filha Melissa aceitou ir à caça /  Foto: Danilo Kossoski
Frutinha desperta atenção pelo sabor entre cítrico e doce, mas encontrá-la exige persistência


Além do calendário preso à geladeira, uma maneira ainda mais antiga de marcar a passagem do tempo consiste em observar as plantas. E é quando as amoras-pretas surgem, pendendo de galhos verdes e atiçando a degustação por crianças na saída da escola, que está no início a primavera. 

Em Ponta Grossa, está aberta a temporada de caça às amorinhas. A Morus nigra se caracteriza pelo sabor entre cítrico e doce, e não pode ser encontrada em todas as esquinas. Mas, quem acha um pé carregado das frutinhas é recompensado. As manchas bordô nas camisetas são um efeito colateral do sabor, oculto entre as abundantes folhas verdes capazes de alimentar o famoso bicho-da-seda.

Amorinhas pretas

Para os mais velhos, as amorinhas pretas têm sabor de infância e de conquista. Isso porque os frutos surgem, amadurecem e, em poucas semanas, desaparecem. Por isso, buscar as frutinhas junto das crianças pequenas pode ser um bom programa para um fim de semana ensolarado. Algumas delas, inclusive, ficam perto de parques infantis.

Juliano Pazinato, 42 anos, foi uma dessas crianças que subir nas árvores para capturar amorinhas. Hoje tem árvore no quintal de casa, e aproveitava a tarde do último sábado para relaxar debaixo da sombra de amoreira, numa praça do Bairro Jardim Carvalho. "Toma, essas eu colhi de manhã. Leve pra casa pra fazer torta, geleia", diz, estendendo uma sacola plástica com centenas de amorinhas selecionadas. As mais escuras são as mais doces.

Encontrar as menos ácidas é desafio quase tão grande quanto encontrar as árvores. Cada planta oferece um fruto com sabor distinto e com maturação em tempo diferenciado. 

Onde colher em Ponta Grossa

Preparei um roteiro de alguns dos locais onde é possível colher as deliciosas frutinhas, sem ter que invadir área particular. Colha apenas as mais maduras, e sem quebrar galhos, guardando um pouco para quem vier fazer a colheita depois. Confira os endereços:


Rua Afonso Celso: em frente ao número 3356, Jardim Giana, Bairro Neves. As árvores ficam dentro de propriedade privada, mas os galhos ficam, em sua maior parte, na via pública.

Avenida Rocha Pombo: esquina com Rua Monte Alverne, Bairro Jardim Carvalho. Uma árvore se destaca no centro da pequena praça, com frutos maduros e em grande quantidade.

Rua Almirante Wandenkolk: esquina com Rua Euclides da Cunha, Bairro Uvaranas. Uma sequência de pelo menos cinco árvores chama a atenção.

Parque Ambiental: Criticado no passado pela ausência de árvores, o Parque Ambiental conta hoje com espécies de fruto comestível, como pitanga, romã e amoras. A mais carregada de frutos pode ser vista da Rua Ermelino de Leão, no Centro, entre o ponto de ônibus e a pista de caminhada.

Praça Alfredo Pedro Ribas: diante do Hospital Municipal Dr. Amadeu Puppi (antigo Pronto Socorro), no Centro da cidade, a grande árvore é consolo para quem descansar sob a sombra, à espera do horário de visitas aos pacientes.

Rua Silva Jardim: na praça junto à Rua Jacob Holzmann, a amoreira recompensa quem se arrisca a fazer a travessia entre as vias com intenso tráfego de veículos, entre os bairros Oficinas e Olarias.

Biblioteca Pública. Próximo ao parque infantil, ao lado da biblioteca no Bairro Olarias, algumas árvores ainda jovens oferecem as frutinhas escuras.

26 de mai. de 2021

Um bom pedreiro deixa sua obra



O homem da foto é Ariosvaldo da Silva Batista Filho. Mas a maioria o conhecia apenas por Ari. Ele foi mais uma vítima da covid-19. E sua ausência é sentida por mim, minha esposa, minha filha.

Aos 62 anos de idade, Ari partiu sem se despedir, e ainda por cima com promessas de voltar.

Ari era pedreiro autônomo, mas se aventurava em quase tudo que era obra. Era o mestre do improviso, do reparo, do fazer funcionar. Descobri isso lá pelo ano 2014.

Minha esposa quis cobrir a lavanderia. Chamamos um sujeito que fez o serviço de qualquer jeito. Prendeu as telhas com prego de sarrafo. Na primeira chuva com vento a gambiarra estava exposta.

Eu vi que não adiantaria chamar o mesmo cidadão. Foi quando me passaram o contato do Ari. 

Lembro que ele viu com incredulidade o serviço mal feito. Perguntei se tinha como arrumar. Ele analisou, pensou no que fazer, e veio com a frase que depois eu consideraria seu mantra e bordão: "Dá pra fazer, mas... Vai ser difícil."

Apesar da dificuldade, ele arrumou mesmo. Tempos depois, a gente se mudou para um apartamento. Precisávamos de alguém que quebrasse a antiga pia do banheiro e montasse a nova.

O Ari foi a escolha óbvia. Novamente não decepcionou. Também seria ele a escolha para arrumar o telhado de meu sogro.

Quando, enfim, me deparei com outra casa, bem antiga e precisando de reformas, o Ari ajudou a decidir pela compra. Eu acabei aceitando o negócio porque confiava que o Ari ia ajudar nos reparos.

No ano passado, ele reforçou a estrutura do telhado o quanto pôde. Trocou as paredes de madeira cheias de cupim. Consertou parte do piso da lavanderia. Arrumou o vazamento do banheiro. Instalou a pia da cozinha. Aumentou o muro e refez o forro da garagem. Trocou a caixa d'água, retelhou a cobertura, substituiu as calhas. Reforçou o assoalho. Em cada cômodo ele teve uma participação. 

No dia 16 de março ele faleceu. Eu só fui saber em maio. Eu nem sabia seu nome completo. Lamentei ter que apagar seu contato do celular. Esperava ainda poder chamá-lo muitas vezes.

Com o amigo Ari deixei a chave da casa enquanto ele trabalhava sozinho. Era de confiança. Me deu os parafusos e emprestou o grampeador com o qual reformei um par de poltronas. 

Se ficasse um instante ao seu lado, ele parava o trabalho e ficava conversando. Parecia ser seu defeito, mas o meu defeito é que é não ter tempo para conversar com os amigos.

O Ari fazia preço justo. Propunha executar o serviço pra gente pagar depois quando tivesse dinheiro. Nunca aceitamos a proposta tentadora, marca de um profissional que também confiava no cliente.

O Ari era serviço essencial. Um de muitos na pandemia. E era pessoa formidável, que eu lamento não poder encontrar mais. Sei que deu o seu melhor em cada serviço que pedimos. Eu não disse a ele pessoalmente, mas falei que o chamaria sempre que precisasse, e ele viu que era verdade. Certamente o chamaria de novo nos próximos meses.

As pessoas boas vão e deixam suas marcas. Aqui em casa elas estão por toda parte.