2 de jun. de 2009

Caricatura: jeito de trazer à tona meu mau humor

Ser cartunista também não é fácil. Não sei direito por que gosto de fazer os rabiscos. Simplesmente dá vontade e faço. E há alguns anos eu me esforço para canalizar isso que uns chamam de dom. Tento fazer, digamos, um desenho por semana. É pouco. Mas não é minha profissão. É meu hobby. E não poderia fazer muito mais, mesmo que quisesse... e quero.

Não é sempre que surge tempo para desenhar. E, quando crio esse tempo, é porque uma ideia fica latejando em minha mente, e causa uma ansiedade que só é aliviada depois de converter a imagem mental em imagem real. Uma tirinha ou ilustração que possa ser vista, também, pelas outras pessoas.

Mas tem uma dificuldade que me acompanha desde sempre: para a maioria das pessoas, desenho é desenho. Na mente da imensa maioria da população, se você sabe desenhar razoavelmente bem uma árvore... então saberá desenhar um unicórnio. O que, não necessariamente, é verdade.

Levei muito tempo para perceber isso. Desde minha infância, a pedidos, já tentei fazer coisas absurdas. Me aventurei até pelo desenho arquitetônico. Até que, finalmente, notei que sou péssimo caricaturista, mediano chargista, e só consigo ser razoavelmente bom com cartuns, ou tirinhas. Mas, é impressionante, sempre que uma pessoa (principalmente mulher) vê um desses desenhos, imediatamente quer que eu faça uma caricatura sua.

Mais ou menos como quando tem um fotógrafo em alguma festa, e as pessoas que estão lá nem querem saber para quem ele está trabalhando. Mas pedem para ele fazer uma foto delas.

Já atendi a alguns desses pedidos de caricatura. Incrível, ainda consegui agradar à maioria. Mas não vou mais abusar da sorte, depois da mais recente experiência...

De meu ponto de vista, o diálogo aconteceu mais ou menos assim:

_Faça uma caricatura minha.
_Não é uma boa ideia. Não sou bom caricaturista.
_Ah, mas você já desenhou você mesmo, que eu vi.
[Sim, mas eu vivo comigo mesmo desde que nasci, penso]
_Mas não vai ficar bom. - insisto
_Que nada, você é que é muito exigente sobre o próprio desenho.
_É... pode ser. Mas...
_Prometa que vai fazer uma caricatura minha, assim... quando sobrar um tempo.
[Quando sobrar um tempo... uhn... perfeito...]
_Tá bom. Um dia eu faço.
_Oba.

[passa um mês]

_E aí, quando vai fazer minha caricatura?
_Já disse que não sou bom com caricaturas...
_Mas você disse que ia fazer.
_É... quando tivesse tempo.
_Você não vai fazer, né?
_Ah, uma hora eu tento. Vejo uma foto sua no Orkut e tento fazer o desenho.
_Então tá.

[dois meses depois]

_E minha caricatura...?
_Olha, já que você ta insistindo tanto, eu vou fazer. Mas não vai ficar parecida com você.
_Não faz mal.
_Vai ficar um desenho tosco.
_Tudo bem.

[vários meses depois]

_Olha a tirinha que fiz... diz o que você acha.
[ela não olha para a tirinha]
_E minha caricatura? Faz um ano que estou pedindo...
_Não faz um ano.
_Faz em julho.
_Então, não faz um ano.
_Se você não quer fazer, é só dizer.
[achei que isso estivesse evidente, penso]
_Não, tudo bem... vou fazer.
_Vai nada. Só tá me enrolando.
_Tá bom, vou fazer, só pra você parar de encher meu saco.

Manhã de segunda-feira. Levanto com uma única ideia na cabeça. Fazer a maldita caricatura. Acesso o Orkut da pessoa, escolho uma foto. Tento fazer um desenho parecido, que sei que não ficará parecido. Mas ela uma vez disse que não tinha problema...

Faço a lápis, apago algumas vezes. Finalmente passo a caneta por cima. Apago a borracha. Levo ao scanner. Trato no computador. Escrevo o nome da pessoa embaixo do desenho, para que pelo menos quem veja saiba que é ela. Decido colorir o desenho, para tentar deixar menos tosco.

Quando vou enviar por e-mail, noto que a resolução do traço tá toda ruim... Eu tinha escanneado na configuração errada. Então, repito todo o processo.

No começo da tarde, envio a tal ‘caricatura’ por e-mail. E incluo o link para o perfil do Orkut de um colega meu, que sei que é bom caricaturista. Se ela não gostar do meu desenho, pode entrar em contato com ele, penso.

No final do dia, antes de ir dormir, acesso os e-mails. A referida pessoa respondeu:

***

Nossa... se não falasse que era desenho não acreditaria!
(...)
CARICATURA: é um desenho que retrata uma pessoa real, realizando distorções em sua fisionomia, mas permitindo que ela seja reconhecida. Basicamente, se você vir um desenho e reconhecer, claramente, que é a representação de uma personalidade conhecida, estará diante de uma caricatura.
Conclusão disso tudo: Quem é esse ser da imagem? Porque nem a cor do cabelo lembra a minha pessoa.
P.S.: não tenho como acessar Orkut aqui (...), ou seja, não entendi sua mensagem.

***

A resposta que enviei a esse e-mail não foi das mais agradáveis. Então, ainda recebi uma tréplica.

***

Desculpe pelo seu mau humor... eu estava brincando... mas que realmente não ficou nada a ver isso é verdade...
Não precisa mais fazer... como não precisava ter feito dessa vez... como eu disse... era só dizer que não queria fazer...

***

Foi a primeira vez que alguém pediu desculpas pelo meu mau humor... E acho que foi a última.
Se outra pessoa, portanto, ainda quiser que eu faça uma caricatura. Esqueça.
Não importa o quanto vá insistir... Não sou bom em caricatura.
E se ainda insistir, vou emendar a frase:
Deu pra entender, ou quer que eu desenhe?